A VELHICE E A COVID 19
- Sylvia Romano
- 6 de set. de 2020
- 7 min de leitura

Em dezembro de 2019, a cidade de Wuhan na China reportou um surto de pneumonia de causa desconhecida que rapidamente se espalhou pelo país. O patógeno causador da doença foi identificado como um novo coronavírus, que foi denominado como SARS-CoV-2, ou Coronavírus da Síndrome Respiratória Aguda Grave-2. A Organização Mundial de Saúde (OMS) nomeou a doença causada pelo novo vírus de covid-19 (Coronavirus Disease, ano de 2019), sendo declarada uma emergência de saúde pública de importância internacional em 30 de janeiro de 2020, e em 11 de março de 2020 como uma pandemia 1 . Desde então, iniciou-se um esforço global na produção de informações com a finalidade de desvendar os aspectos clínicos, epidemiológicos e fatores prognósticos da doença. Em 22 de Janeiro de 2020 a Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde do Brasil, divulgou as primeiras medidas de controle da infecção pelo até então novo coronavírus, divulgando os sinais e sintomas, os critérios de definição de casos suspeitos e o fluxo de notificação, que inicialmente se deu mediante o Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde Nacional, Com relação aos fatores de risco para o agravamento da doença, uma revisão demonstrou que os casos mais graves da doença que evoluem para pneumonia têm maior probabilidade de serem de pacientes mais velhos, do sexo masculino e com comorbidades, comparado aos casos mais leves. Entretanto, mais estudos foram recomendados para esclarecer as características epidemiológicas da covid-19, bem como identificar os fatores de risco e prognóstico dos pacientes infectados com o vírus SARSCoV-2 1 . A maior parte dos estudos desenvolvidos até o presente momento foram provenientes de c Após 8 meses, segundo dados da OMS em 25 de agosto de 2020, já existiam mais de 23 milhões de casos confirmados e 810.492 óbitos decorrentes da doença no mundo. O Brasil é o segundo país com maior número de casos e óbitos pela doença no mundo, com mais de 3,5 milhões de casos confirmados e 115.309 óbitos3 A maior parte dos estudos desenvolvidos até o presente momento foram provenientes de cenários internacionais e de contexto clínico-hospitalar5 . Com relação aos fatores de risco para o agravamento da doença, uma revisão demonstrou que os casos mais graves da doença que evoluem para pneumonia têm maior probabilidade de serem de pacientes mais velhos, do sexo masculino e com comorbidades, comparado aos casos mais leves A variável dependente consistiu no tempo de observação em dias até a ocorrência o desfecho (óbito por covid-19) a partir da detecção deste paciente nos sistemas de informação para vigilância epidemiológica do agravo. O tempo de observação máximo foi de 165 dias e consiste no tempo decorrido desde a identificação do primeiro caso de covid-19 no estado. O tempo de sobrevivência foi avaliado a partir das variáveis independentes: (a) faixa etária (até 59 anos, de 60 a 79 anos e 80 anos ou mais), (b) cor da pele (branco, nãobranco e sem informação), (c) sexo (masculino, feminino), (d) presença de comorbidades (sim, não e sem informação) e (e) residir na capital ou em municípios do interior, com a finalidade de identificar os fatores de risco e fatores prognósticos para a ocorrência de óbitos por covid-19. Durante o período de seguimento, foram notificados 52.607 casos e 1.842 óbitos por covid-19 no estado. A maior parte dos casos ocorreu em indivíduos de até 59 anos (81,0%), de cor de pele não branca (59,5%), sexo feminino (52,8%), que residem em municípios do interior (61,7%) e que não possuem comorbidades (75,7%). Com relação aos óbitos, a maior parte ocorreu em indivíduos com faixa etária entre 60 e 79 anos (43,2%), cor de pele não branca (50,9%), sexo masculino (55,4%), que residem no interior (54,6%), que possuem comorbidades (69,4%). Maior letalidade foi observada em idosos com 80 anos ou mais (27,6%), em indivíduos que possuem comorbidades (12,4%) e sem informação sobre a presença de comorbidades (13,5%) (Tabela 1). Considerando como evento de interesse o óbito por covid-19, a probabilidade de sobrevivência de indivíduos sem comorbidades ao final do período de observação foi de 99,4%, enquanto os indivíduos com comorbidades foi de 86,4%. Ao considerar a faixa etária, a probabilidade de sobrevivência acumulada de indivíduos com até 59 anos foi de 98,7%, enquanto entre os indivíduos com 80 anos ou mais foi de 69,7%. . Apresentaram maiores riscos de ocorrência de óbitos por covid-19 os indivíduos com 80 anos ou mais de idade DISCUSSÃO Os resultados do presente estudo revelaram quais os principais fatores que estão associados ao maior risco de ocorrência de óbito por covid-19, trazendo importantes subsídios para a tomada de decisão clínica e política, uma vez que permitem reconhecer os fatores associados ao prognóstico da doença a partir do momento da identificação do caso pelo sistema de saúde. Com relação à faixa etária, observou-se um efeito dose-resposta, onde os idosos entre 60 e 79 anos apesentaram risco 3,87 e idosos com 80 anos ou mais apresentaram risco 8,06 vezes maior de morrer por covid-19 que indivíduos até 59 anos. A associação entre idade avançada e sintomas graves da covid-19 foi observada em diversos estudos clínicos 1,5,7. Ao comparar pacientes que desenvolveram Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) em decorrência da covid-19 com paciente sem SRAG, observou-se que os pacientes que desenvolveram sintomas mais graves eram idosos, e a maioria destes possuía comorbidades. Além disso, foram observadas altas taxas de mortalidade nos pacientes com SRAG moderada ou severa7 . No Brasil, desde os primeiros meses de pandemia, tem se observado que indivíduos idosos representam o maior percentual dentre os óbitos por covid-19, além disso apresentam taxas de letalidade acumulada superiores às encontradas na população em geral. Também foi observada a influência de fatores sociodemográficos contextuais relacionados à raça e renda nas taxa de mortalidade por covid-19 na população idosa8 . Ao avaliar os apenas os óbitos em decorrência da covid-19, um estudo demonstrou que 31,5% dos casos tinham idade superior à 60 anos ou comorbidades5 . Desta forma, população idosa merece atenção especial, por apresentar também maior vulnerabilidade para o desenvolvimento de comorbidades, como as doenças cardiovasculares e cerebrovasculares, câncer e transtornos mentais, o que pode potencializar o risco de óbitos por covid-19. Dessa forma, existe a necessidade de serem desenvolvidos protocolos preventivos específicos, tendo em vista a heterogeneidade da população idosa, com maior enfoque nos idosos com maior faixa etária e presença de comorbidades .
O maior risco de ocorrência de óbitos por covid-19 foi observado em indivíduos idosos, sobretudo os com idade acima de 80 anos, pacientes que possuem comorbidades, homens e ter cor de pele não branca. Atualmente, o efetivo controle de infecção é a única forma de prevenir a disseminação da SARS-CoV-2 1 . Entretanto, ao conhecer as populações com maior risco de agravamento e óbito pela doença, pode-se lançar mão de estratégias terapêuticas que previnam o agravamento da doença nessas populações. Além disso, contribui para que se prepare a rede de atenção hospitalar, a partir do momento do reconhecimento do perfil epidemiológico dos casos diagnosticados, prevendo a demanda de utilização de leitos hospitalar
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